Tenho muitas pessoas dentro de mim. Dentre elas, um bicho enorme, amedrontador, que fala coisas horríveis e sem volta, ruge, grita e arregala os olhos. Coitadinho, morre de medo de ser abandonado, deixado sozinho. Para conseguir o amor garantido, berra ainda mais. Parece que ele vai testando até onde os demais aguentam. Quando ele fala mais alto e está mais presente que as outras pessoas que moram dentro de mim, acabo me parecendo mais com ele. É duro colocá-lo no seu lugar novamente. Muito difícil mesmo. Acho que o nome dele é Medo.
Li certa vez que o oposto do amor é o medo. E não o ódio, como pensamos. O medo afasta, divide, destrói. O ódio é facilmente revertido, pois nele mora a paixão. Quando o Medo aparece, tento alimentá-lo, perguntando: "do que você precisa?". Às vezes ele quer colo, outras vezes ele quer ser dominado e outras ainda apenas ser ouvido. Tenho que alimentá-lo e pedir aos outros o que ele necessita. Quem sabe assim ele se acalma por um tempo. Sim, porque sei que ele está sempre ali.
Bom, aí surge outro carinha que mora dentro de mim. Vem surgindo duro, categórico: "de jeito nenhum! Você não precisa de ninguém. Precisa se virar sozinha! Autossuficiência! Ademais, os outros podem deixá-la a ver navios. Não confie em ninguém!" Esse aí, também já sofreu muitas decepções e frustrações. Quer provar a todo tempo que consegue sozinho. É gordo, precisa de alta camada de proteção. Já tomou conta de mim por vários anos. E fiquei literalmente igualzinha a ele. Penso que ele se chama Orgulho.
Enquanto eles se enfrentam numa guerra sem fim, aparece alguém humilde, com a voz branda, suave e sábia. Vem dizendo: "nem todo o conhecimento vem pela razão! Dê ouvidos a ambos, mas escolha com coração o que é certo de fazer. Você consegue e pedir não diminui seus méritos. Mesmo Jesus pediu para que aquele cálice amargo dos humanos fosse afastado de seus lábios." Essa voz me acalma. Gostaria de ser essa pessoa 100% do tempo. Não é homem, nem mulher. Tem forma etérea. Caminha com passos calmos, mas precisos e seguros. Acho que o nome dela é Amor.
Acabo pedindo aos outros que me cercam o que o Medo quer e respondo ao Orgulho que conseguimos aguentar o "não". Algumas vezes, não conseguimos o que o Medo queria. O Orgulho sai rindo e se vangloriando, "não falei?". Acredito que isso aconteça porque nem sempre os outros conseguem estar vestidos do Amor, assim como eu mesma não consigo ser Amor 100% do tempo. Mas procuro quem o esteja vestindo hoje, que é quando o Medo precisa. O mais surpreendente: quase sempre consigo o colinho, ou ouvidos compreensivos.
Conhecendo essas pessoas em mim e nos outros, aprendi que a impaciência, a intolerância e as agressões não são mais que o Medo gritando para não ser abandonado, para ser compreendido. Estou aprendendo com o Amor que ele nasce em primeiro lugar para nós mesmos. O jeitão do Medo não leva a lugar algum. Não consegue o que realmente precisamos.
O amor próprio possibilita o amor altruísta, generoso. Conhecendo a nós mesmos e às várias pessoas que nos habitam, temos mais chance de construir relacionamentos saudáveis, vivendo de bem com a vida.
Leia mais! http://minhavida.uol.com.br/conteudo/11680-Aprender-a-conviver-com-os-proprios-sentimentos-e-uma-arte.htm
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