por Renato Corrêa e Juan Weik
A origem do medo de monstros
Nós tememos os monstros, de maneira geral, porque nossos medos são universais. Os medos mudam com as experiências, é verdade, mas existem aqueles que, segundo a demanda evolutiva, são passados na carga de informações de nosso DNA. Pesquisas realizadas em escolas de Chicago, por exemplo, mostram que os maiores medos das crianças são leões, tigres e cobras – perigos inexistentes naquela cidade.
Em seu livro "Como a Mente Funciona", o cientista cognitivo Steven Pinker descreve os medos que espontaneamente desenvolvem-se nas crianças de até cinco anos de idade: aranhas, escuridão, cobras, águas profundas. Como Pinker deixa claro, todos esses temores são objetos fóbicos clássicos. Temores que, quando não devidamente superados na infância, acompanham as pessoas em sua fase adulta na forma de fobias. Uma resposta biológica para a manifestação da cultura do monstro em todas as sociedades é que ela incorpora esses medos inatos – por isso o bestiário universal possui tantos exemplos de serpentes enormes que habitam as profundezas do mar ou de um lago (medo de cobras e águas profundas), de aracnídeos gigantes (medo de aranhas) ou de monstros que vivem em cavernas profundas ou que apenas atacam durante a noite (medo do escuro).
“A crença em monstros é realmente evolutiva e adaptativa. Nós temos medo de cobras e aranhas certamente não porque elas são grandes e podem nos atacar, mas porque geralmente são venenosas. Então esse medo nos leva a evitar esses bichos, o que provavelmente salvou vidas e se tornou impresso geneticamente”, concorda o antropólogo norte-americano David Gilmore, especialista no estudo dos monstros.
Mais do que o temor de ser envenenado, porém, o medo primitivo que subsiste mais intensamente em qualquer homem ou mulher, de qualquer idade e sociedade, é o de virar refeição de outro animal. Isso é facilmente compreensível quando se tem em mente que grandes feras devoradoras de carne dividiram o espaço com seres humanos durante a maior parte da história. Essas bestas fizeram parte da formação psicológica do Homo Sapiens e de sua identidade como espécie. Predadores como ursos, tigres, leões, tubarões e crocodilos eram tão importantes para nossos antepassados que estiveram inclusive presentes em sistemas espirituais.
Como escreveu o americano David Quammen em seu livro "O Monstro de Deus", “entre as formas mais primitivas de autoconsciência humana estava a consciência de ser carne”. Não é muito difícil perceber o reforço dessa percepção e ansiedade míticas em monstros como o gigante devorador de homens Grendel, do poema épico anglo-saxão Beowulf, ou nos predadores da série Alien. A mensagem por trás de histórias como essas é clara: existe algo muito pior do que simplesmente ser morto; é ser devorado.
Dessa forma, os monstros estão relacionados com sentimentos que refletem no íntimo de nossa espécie. Sensações e medos que foram fundamentais para a evolução humana. Em "The Others: How Animals Made Us Human" (“Os outros: como os animais nos fizeram humanos”, sem tradução para o português), o ecólogo e filósofo Paul Shepard escreveu sobre a possível metamorfose de predadores selvagens em monstros na psique humana: “Nosso medo noturno de monstros provavelmente tem suas origens nos princípios da evolução de nossos ancestrais primatas, cujas tribos foram desbastadas por horrores cujas sombras continuam a elicitar nossos gritos de macaco em teatros escuros”.
Reportagem completa: http://pessoas.hsw.uol.com.br/monstros.htm
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